terça-feira, 29 de janeiro de 2013

104 vezes o silencio





A tragédia acontecida lá na cidade de Santa Maria, ocasionando a morte de mais de duzentas pessoas em sua grande maioria estudantes das faculdades lá existentes, repentinamente virou sensação em todas as mídias. Em minutos apareceram técnicos, policiais, advogados, promotores, políticos, autoridades de todos os escalões surgiram como que por encanto para frente as câmeras e os holofotes darem suas versões sobre o fato. Impressionou-me muito o relato de um jornalista que disse ter visto em um celular mais de 104 chamadas para a filha, nas mãos da qual estava o telefone. Impossível fica, para qualquer pessoa mesmo que acostumada com o evento morte pintar com cores reais um quadro de tamanha tristeza. A mãe, avisada de que algo de grave está acontecendo na boate, sabe que a filha havia ido para a tal festa naquele local, a primeira providência, acionar o telefone para de viva voz ter a certeza de que tudo está bem, ou pelo menos saber o que, na verdade está acontecendo. 

Chama uma, duas, três, dez, vinte, cinquenta, cem vezes e a resposta.... o silêncio.A mão que deveria atender o chamado queda inerte,a voz que deveria responder ao apelo, está calada. Assim como aquele telefone outros mais numa ensurdecedora sinfonia trágica, não respondem aos apelos de pais, irmãs. namoradas, familiares, porque seus donos estão dentro do inferno,já sem vida.Um cenário macabro, um capítulo trágico de uma novela real onde os atores em sua maioria são jovens estudantes, universitários em cujos scripts constavam apenas palavras de alegria, seus papeis nesta estranha trama eram os mais variados, eram aspirantes a médicos, engenheiros, administradores, farmacêuticos. O que eles infelizmente não sabiam era que na verdade todos estavam condenados ao fim prematuro, por obra e graça de autoridades que costumam apegar-se a futilidades, exigem, cobram, prendem, multam, mas, não tem condições de fiscalizarem a obediência, o cumprimento de tantas ordens. 

A cada vez que a roleta se movimentava permitindo o acesso de mais um aquela ratoeira, eram gritos de alegria, eram conhecidos que se encontravam, eram abraços, beijos tudo era festa tudo era comemoração. Ninguém se apercebia de aquele local já estava com a lotação esgotada, os seguranças da portaria não se comunicavam com aqueles do interior, cada um desempenhava a sua função de acordo com a sua cabeça. Não havia intercomunicação. Num local onde se permitiam 700 pessoas (segundo a BM) somavam-se mais de mil e duzentas, ninguém se apercebia de que a porta de entrada já estava apertada para a passagem de apenas duas pessoas por vez.Tudo era alegria, tudo era comemoração até que de repente surgem labaredas,o material sintético começa a pegar fogo, a fumaça negra e altamente toxica invade o ambiente, instala-se o pavor, o pânico, as pessoas correm desesperadas em busca da saída, a sinalização inexiste, ou não é possível ser vista devido a nuvem negra e densa que cobre o espaço.Quedas,desmaios,tropeços, quem pode ajuda quem precisa,outros vão ficando pelo caminho já agonizando, os pulmões arrebentando,olhos lagrimejando, cegos pela fumaça. 

Num verdadeiro labirinto alguns ainda confundem as portas dos banheiros com a porta de saída e se amontoam tentando inutilmente sair por uma basculante que por maior das desgraças esta trancada para evitar fugas. Por isto, é que uma mãe chamou desesperadamente pela filha e teve como resposta, o silencio. Mas, o mais triste em tudo isto alem das mortes e da tristeza de parentes amigos e familiares é de que somente agora apareçam tantos inteligentes, tantas autoridades a botar o dedo no nariz dos responsáveis, porem, não vi nenhuma destas autoridades, virar o dedo contra o seu próprio nariz. Não se use como argumento o fato de que não sabiam disto ou daquilo, não se usem como escudo apenas o músico (que, dizem ter acendido um sinalizador) e o dono da boate. Tem muitos graúdos que devem explicações. E no ouvido de todas estas autoridades que deverá ficar tocando a campainha não de apenas um celular, mas o celular de todas as vítimas, por muitos anos,para que entendam finalmente o que significa chamar 104 vezes por um filho, e receber como resposta o silencio.

Opinião do MARESIAS

Completo, com muito orgulho mais de oito mil artigos. Fora aqueles publicados no jornal VS. (São 40 anos de parceria) A tônica na quase maioria destes espaços, foi unica exclusivamente com o tema SEGURANÇA. Quando acontecem tragédias não só como esta de Santa Maria, mas as mortes no trânsito, a gente que se debruça sobre o tema cai numa especie de "torpor"de abatimento, desânimo.Impossível acreditar que tantas vidas humanas estão sendo dizimadas por falta de fiscalização. E, o pior a cara de pau de tantos inteligentes que só aparecem para dar condolências as famílias,e declarar o obvio: vamos tomar serias providencias. Que tudo não fique no esquecimento, que tudo não se restrinja a politicagem.


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