quarta-feira, 27 de março de 2013

Cem anos depois.


Ontem, depois do almoço, resolvi, junto com minha esposa, acompanhar meu filho Ângelo num passeio até a cidade de Pinto Bandeira, até pouco tempo distrito de Bento Gonçalves. Foi nesta cidade que há cem anos nasceu meu pai, Ângelo Luigi Strapazzon. Ele, sempre me falara de Pinto Bandeira, e de Barracão, como sendo sua cidade de origem, mas, pouco letrado, não sabia exatamente onde havia nascido. Hoje, a internet não nos permite ficar no anonimato, muito menos ficar na dúvida sobre qualquer assunto. Com alguns “cliques” e um pouco de paciência a gente acaba chegando a bom termo. Subir a serra é sempre um prato cheio para quem procura belas paisagens, sossego, paz, comida boa, mas principalmente aquela nostalgia dos tempos passados através das edificações antigas, casas típicas dos primeiros imigrantes.

Deslizar pelo asfalto, ainda que com algumas falhas, naquelas paisagens, naqueles cenários, de moinhos, velhas casas de madeira, taipas, açudes, córregos,lagos e jardins coloridos, nos obriga a mergulhar num passado distante cem anos. Enquanto o carro vencia curvas, aclives e declives rumo ao nosso destino eu tentava imaginar o sofrimento, as agruras, e a luta sob o tempo inclemente dos primeiros desbravadores, meus antepassados, meus avós, Antonio e Vergínia quando ainda jovens subiam pelas trilhas, hoje caminhos asfaltados, carregando malas com roupas,e utensílios de uso caseiro, alem das ferramentas para fundarem, juntamente com outras tantas famílias de imigrantes, o povoado de Pinto Bandeira. Quando finalmente chegamos, caia uma fina chuva, as ruas calçadas de pedras, impecavelmente limpas, as casas modernas livres de cercas e grades, com jardins coloridos cheios de flores, me davam uma sensação de não estar aqui no Brasil. Enquanto espero, permito-me admirar a maneira de como vivem os habitantes daquela cidade tão acolhedora.

A paisagem, é outra, morros vegetação, vales, pouco movimento, a limpeza do local as casas todas pintadas com cores vivas, tudo caprichosamente limpo, sem placas de propaganda, sem pichações , logo ali imponente a torre da igreja matriz de pinto Bandeira. Ali é o nosso destino. Estou em busca da certidão de batismo de meu pai, Ângelo. Inimaginável a sensação que sinto pisar nos degraus da imponente igreja. Ali, naquele mesmo local, talvez ainda no chão batido e empoeirado do pequeno povoado, haviam pisado meus avós, ali naquele exato lugar, onde cem anos após eu me encontro com minha mulher e meu filho. No livro 02, folhas 101, nº 74 de registros exemplarmente limpo, da paróquia de Nossa Senhora do Rosário de Pompéia consta o assento de registro do batismo de Ângelo Luis Francisco Strapazzon.

Neste momento fico imaginando a cena; os familiares, os padrinhos, o nenê alguns convidados sobem os degraus da pequena capela de Nossa Senhora do Rosário, depois tento recriar o cenário da época com as ruas ainda de chão, as carretas, os carros de boi e as pessoas em procissão de volta a casa. Ainda no trajeto já na volta vamos parando para fotos dos prédios, sou apaixonado pelas casas antigas, não importa se de alvenaria ou de madeira, algumas desta já em total estado de precariedade em função de tantos anos passados, uma delas a casa de madeira dos proprietários da Cantina Strapazzon, paredes já enegrecidas pelo tempo, tábuas das quais já caíram pedaços, mas que mesmo assim, passados mais de cento e onze anos continuam ali, testemunhos vivos de uma historia de sacrifícios, suor, e trabalho. Imagino meu pai ainda jovem nas lides da família, no cultivo dos parreirais, na colheita, e depois já adulto abandonando tudo em busca de uma nova vida, na cidade de Bento Gonçalves. Meu pai, segundo nos contava, tinha mais treze irmãos, entre homens e mulheres, os quais foram casando e ficando por ali mesmo, outros no entanto, como ele próprio, haviam se decidido por tentar a sorte em outros lugares,primeiro em Bento Gonçalves e depois com a Fábrica de Papel e Papelão Justo e Cia. Vindo para São Leopoldo. Na volta não podia deixar e lembrar o encanto, e a tranqüilidade daqueles cenários.

A medida que o carro avança em direção a região metropolitana parece renascer aquela angústia, aquela pressão, aquela insegurança. Talvez, quem sabe,num futuro ainda possa tentar um recomeço, junto a paz daquele jardim chamado de Pinto Bandeira.





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