sábado, 13 de julho de 2013

O protesto


O Otacílio é um cara decidido, é o típico cara faz tudo, ele é o quebra galho da vizinhança, e por isto mesmo está em todos os lugares, pronto para dar a sua contribuição. Foi num destes momentos de conversas ao pé do balcão de um boteco que o cara ficou sabendo que uma grande mobilização estava sendo organizada. A cabeça fértil do Otacílio teve um estalo, vou nessa, eu também vou protestar. Na hora e local combinados lá estavam as lideranças, bandeiras, cartazes, faixas, gritos de comando, o pessoal chegando devagarzinho alguns meio receosos, observando, ficando pelas beiradas. Mas, o Otacílio como bom ativista, foi se infiltrando, pregando um cartaz aqui, esticando uma corda ali, ajudando a esticar o fio do microfone, ele não parava, não conseguia ficar sossegado, em meio aos gritos, e aos discursos inflamados. O sangue foi esquentando, o clima começou a ganhar contornos de violência, ele próprio já havia levado uma bordoada na cabeça com um cano plástico, mas não iria desistir, ele era mais um  entre os revoltosos. Foi quando ouviu de alguém a frase que iria mudar para sempre a sua vida – Olha pessoal tinha que aparecer algum voluntário para acorrentar-se a uma árvore, assim ninguém vai nos tirar daqui. Todos gritavam, vociferavam,agitavam bandeiras, e aquela movimentação toda acabou tocando nos brios do Otacílo – Eu fico, eu fico acorrentado. Num piscar de olhos e lá estavam as correntes, os cadeados, lindos reluzentes, aos gritos de no poste, no poste, ali no poste. Carregaram o pobre, nos ombros entre vivas e gritos de ordem. E, foi assim que enquanto a turba enfurecida lascava todos os tipos de impropérios contra as autoridades o Otacílio foi literalmente colado ao poste, todo envolto em correntes, e todas as correntes,é claro, travadas com reluzentes cadeados.A tarde foi passando, assim como o entusiasmo da massa, e muito calmamente o movimento foi esvaziando, e o Otacílio começou a sentir um amargo na boca. Ele estava ficando só, com seus pensamentos, e estes não eram nada bons. Pro fim os manifestantes saíram em passeata, restou tão somente o pobre homem ali, acorrentado, com sede, suando frio, pois as necessidades fisiológicas o estavam pressionando. As pessoas passavam, o elogiavam, apertavam sua mão, mas ele não via nada daquilo, queria apenas saber quem afinal estaria com as benditas chaves de todos aqueles cadeados. As cólicas eram terríveis, o estado nervoso fazia com que elas não dessem trégua. Os bombeiros foram acionados, mas eram muitos cadeados, as correntes eram grossas. Foi quando o Otacílio literalmente começou e derreter. Daquele dia em diante jurou que país poderia pegar fogo, mas, protestar? Nunca mais.

Nenhum comentário: